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Catarina Rabello

Profissionais da Saúde e Pandemia do COVID-19

Por | Dinâmicas disfuncionais de trabalho, Resiliência, Saúde mental e Pandemia, Saúde pública, Simbolização e elaboração psíquica, Subjetividade e relações de trabalho, Trabalho do Sonho | Nenhum Comentário

 

Ao acordar de um sonho de horror, me vi mobilizada a escrever sobre o estresse traumático que milhares de profissionais da saúde vêm  sofrendo, sendo submetidos a cenas reais e impactados por terrores que a própria mente se esforça por metabolizar, e diante do insucesso frente à magnitude da pandemia, muito semelhante aos fronts de guerra, alguns gritam por socorro. Se alguns estudiosos hoje falam sobre a “Psicologização da Pandemia”, provavelmente nunca tiveram a oportunidade de atuar numa linha de frente tão drástica como as equipes de saúde da rede pública nacional que atendem as vítimas da pandemia do COVID- 19. O sonho se desenvolveu em Ushuaia, no trem chamado “trem do fim do mundo”. Tinha ido para lá participar de uma jornada científica, e toda minha história se desenvolve naquela estação de trem. Passados alguns dias, acordo de sobressalto, vejo pessoas correndo desesperadas, não consigo me situar no tempo nem no espaço, apenas uma nuvem cinza e um cheiro horrível de fumaça, meus olhos não conseguem focar quase nada. Eu havia dormido agarrada a algumas apostilas do curso, e quando consegui focar alguma imagem, vi uma amiga correndo de calça preta, era de veludo, ela entrava correndo em outro vagão como todas as outras pessoas, alucinadas, umas por cima das outras, conquistando um espaço em direção à frágil possibilidade de sobrevivência. Fui atrás dela querendo seguir alguma referência, mas não cheguei a tempo e o trem partiu. Olhei em volta, me senti completamente só, não sabia o que fazer, estava impedida de voltar ao meu vagão, tudo cheirava a queimado, tudo preto, e a única coisa que eu tinha como apoio eram aquelas apostilas com as quais havia dormido abraçada. Eu pensava, pensava, mas não encontrava uma solução. Havia perdido o trem que salvara inúmeras pessoas, perdi minhas malas, perdi minha bolsa, sem dinheiro, sem roupas e sem documentos, o que eu faria com todo aquele desamparo? Ir até um bar e pedir por uma comida…humilhação jamais imaginada. Ficar sem perspectiva, sem ter o que fazer, não saberia como voltar pra casa, não saberia como continuar esta jornada, onde comer, onde dormir, era um desamparo absoluto, absolutamente só em terra estranha…impossível metabolizar tudo isso. Felizmente acordei e novamente tive dificuldade de me situar, afinal eu tinha vivido aquelas cenas de maneira tão realista, que demorei pra acreditar que não era real, apenas uma produção alucinatória da minha mente.

Infelizmente cenas reais do horror da pandemia têm impactado milhares de profissionais da saúde. Participar das equipes de atendimento psicológico voluntário a estes profissionais tem me ensinado muito, não somente quanto aos efeitos psíquicos dos traumas vividos, mas sobre a importância do grau de resiliência que é requisitado de cada um que se desdobra para dar continuidade a um ofício quase humanamente impossível, quando em contato com os horrores da falta de recursos mínimos de proteção à vida, vivências de desrespeito e uma violência velada em inúmeras unidades da rede de saúde pública ao longo das linhas que cortam o nosso país. Retomadas da economia escondem o impacto da verdadeira tragédia. Não fosse uma tragédia econômica e social, somos obrigados a conviver com uma inércia de lideranças que pouco se importam com a violência imposta à rede de saúde, mais especificamente a saúde pública. Por mais maquiada que possa parecer a realidade da saúde nacional, falta muito ainda à luz dos direitos humanos, onde no microcosmos das equipes de saúde, o profissional fica dividido entre a decisão de continuar ou abandonar, desde o seu posto de trabalho, sua carreira colocada em risco, até a tarefa de decidir sobre quem morre e quem vive.  Onde chegamos? Com os recursos mentais esgotados dos profissionais da saúde da linha de frente desta batalha à sobrevivência, torna-se coletivamente invisível o efeito das consequências mentais e psíquicas diante das estatísticas diárias da distribuição da pandemia pelo planeta, aproximando-se hoje de sete milhões de vítimas. Entretanto, as vítimas sobreviventes do desamparo absoluto atinge cifras também inimagináveis. Fazemos parte de uma legião de pessoas que teriam muito a falar coletivamente, mas, diante de tantas ameaças, os profissionais da saúde não têm outra escolha, a não ser reservar um pouco da sua verdade ao amparo do sigilo do atendimento psicológico. Há um silêncio perturbador, que se esconde por detrás dos sintomas de depressão, ansiedade, pânico e estresse pós-traumático, que indica ao mesmo tempo, o quanto a natureza humana é capaz de se reorganizar diante de tanto horror. A capacidade de sobrevivência e saúde mental exigem estarem intimamente  associadas à capacidade de resiliência ante o enfrentamento dos medos que invadem o dia-a-dia dos profissionais da saúde, necessitando de acolhimento, escuta e atendimento adequados.

Talvez nós, os psicólogos, além de sermos os vetores da escuta das dores traumáticas isoladas e solitárias, possamos representar  um dos pequenos, mas não menos importantes, vetores de um resgate da saúde social e rompimento do silêncio que se impõe em meio a urgências e emergências, aos profissionais que necessitam gerir situações inusitadas, precisam expor suas angústias e requerem uma possibilidade de questionarem sobre a ética quanto à escassez de recursos básicos de proteção nos serviços de saúde. Colocar-se hoje em uma frente de trabalho na saúde contra a pandemia do COVID-19 torna-se um desafio tão desorganizador como passar por uma tormenta no meio do oceano. No relato do sonho, mistura-se o onírico a uma realidade muito próxima e semelhante à perda de referências a que o trauma da pandemia expõe as equipes de saúde. Transcorrido em Ushuaia, a cidade mais austral do planeta, sabe-se que o frio, a neve e a dureza de suas montanhas não impedem que a vida continue, que a belíssima imagem de suas paisagens se mantenha impressionante, e que a natureza, lutando contra um desastre ambiental,  venha um dia a se recompor, mesmo sendo obrigada a conviver com os efeitos trágicos da introdução dos castores canadenses na região, causando um desequilíbrio ecológico sem precedentes e destruindo suas matas… Mais um desequilíbrio por erro humano gerando trágicos efeitos. Assim vemos os profissionais da saúde, tentando lutar por uma sobrevivência de seus semelhantes, de si mesmos e das próprias condições essenciais à saúde, desenvolvendo toda a sorte de defesas para lidarem com o desamparo da perda de referências e solidão absolutas.

 

 

Catarina Rabello

Psicóloga CRP 30103/06
Psicanalista membro efetivo do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae

Contato: São Paulo (SP) Brasil  Whatssapp (11) 971121432

Diálogos Prováveis / Psicanalista Catarina Rabello

Por | Abordagem psicanalítica, Diálogos em Psicanálise e Poesia, Dinâmicas de Relacionamento, Psicanálise, Psicoterapia de Casal, Simbolização e elaboração psíquica, Subjetividade e autoconhecimento, Terapia familiar sistêmica, Terapias de Casais | Nenhum Comentário

 

Entre mim e você
Centenas de milhares de quilômetros
Quase nada comparado ao cosmo
No tudo ou nada que nos une
Às vezes sou Terra
Às vezes sou Lua

Orbitamos o mesmo espaço
Suportamos marcas e crateras gigantes
Sob o calor do mesmo sol
Lado a lado caminhamos
As estrelas que admiramos
Seriam as mesmas que focamos?

O seu lado escuro
Tanto mistério para mim…
Por mais que eu me esforce
Não consigo ver em você
O que você vê em mim
Me desdobro em transparência
Você se mostra por inteiro
Porém só na aparência

Mas que paradoxo!
Tão maior e mais potente
Não consigo ultrapassar
Nem as linhas mais tênues
De um horizonte resistente

Relação leve vulnerável
Rígida e incógnita
Alusão e ilusão submersas
Tão familiar e estranha atração

Diálogo provável e improvável
No silêncio da escuridão
Segue eternamente estável
O mistério de uma relação

 

As dificuldades de relacionamento amoroso nem sempre são evidentes num primeiro momento. Em geral, após passado o momento da paixão, iniciam-se os conflitos e questionamentos, e quantas dúvidas aparecem sobre o lado que não estava tão acessível quanto ao outro e a si mesmo nesta relação, com dinâmicas específicas e difíceis de lidar, que podem gerar sofrimento e sintomas psíquicos e requerem a ajuda de um profissional especializado.

 

Catarina Rabello
Psicanalista Psicóloga Crp 30103/06
Psicoterapeuta de Casais e Famílias
Psicanalista membro efetivo do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae
Consultório São Paulo: (11) 971121432
Tatuapé: R. Serra de Botucatu, 48
Perdizes: R. Ministro Godói, 1301

 

Filme Honeyland: Diversidade e Adversidades/ Psicóloga Catarina Rabello

Por | Cinema e psicanálise, Cultura, Dinâmicas disfuncionais | Nenhum Comentário

 

O documentário Honeyland indicado para o Oscar 2020 testemunha de maneira lindíssima a história da protagonista principal Hatidze, criadora de abelhas em um lugar distante da Macedônia. O filme revela que é possível mantermos relações mais sustentáveis com a natureza, se soubermos respeitar as suas regras, o seu tempo e a sua lógica. Em meio a um debate ligado à crise das relações do homem com os ecossistemas do planeta e à necessidade de nos conscientizarmos sobre a necessidade de criarmos relações mais sustentáveis, foi solicitado aos diretores por órgãos do governo da Macedônia um filme que documentasse e permitisse um contato muito próximo da população a realidades humanas distantes capazes de conviver e ter acesso aos recursos naturais de maneira harmoniosa, mostrando que é possível manter a exploração de recursos naturais obedecendo a conservação e a sustentabilidade das fontes da biodiversidade regional.

Numa região distante ao norte da Macedônia, onde vivem apenas alguns pequenos povoados, foram encontradas, em uma região de onde todos os habitantes se retiraram, apenas duas habitantes remanescentes, Hatidze de 56 anos e sua mãe Nazife, idosa, doente e impossibilitada de sair da cama. Hatidze é uma cuidadora primorosa em meio a tanta escassez e múltiplas dificuldades de sobrevivência. Sendo a filha mais velha, Hatidze assumiu a incumbência de cuidar dos pais idosos obedecendo à regra familiar e cultural de seu povo e não pode se retirar do povoado junto com seus irmãos. Ela cuida de sua mãe doente, cega de um olho e com dificuldade de locomoção e também cuida das abelhas de onde provê o alimento e sustento para ela e sua mãe. No local onde vivem não há energia elétrica, água encanada, nem rodovia de acesso. A rodovia mais próxima encontra-se a 18 km de distância e Hatidze percorre esta distância a pé até chegar ao povoado mais próximo, onde eventualmente leva os seus potes de mel para vender.

As interações de Hatidze com sua mãe são muito peculiares, porque apesar de uma certa dureza aparente nas interações verbais, percebe-se uma doçura nos cuidados que oferece à mãe, expressando ao mesmo tempo uma aceitação de seu destino e uma enorme capacidade de resiliência frente às dificuldades da vida dura que as duas enfrentam naquele lugar.  Ao longo do filme, aos poucos vamos entrando no mundo de Hatidze, conhecendo-a nas suas maneiras afetivas de interagir com a mãe, com os bichos de estimação e com o meio ambiente, apropriando-nos do conhecimento que ela detém sobre a criação de abelhas, com tanto envolvimento, que passamos a esquecer que se trata de um documentário, e de repente nos encontramos como se estivéssemos diante de uma ficção, assistindo ao desenrolar de uma história com início, meio e fim.

No trato com as abelhas, Hatidze nos toca profundamente com seu gesto cuidadoso e de interação perfeita, estabelecendo uma espécie de conversa com as abelhas, entoando uma espécie de canto para chamá-las, e  sempre que vai extrair o mel das colmeias, repete uma frase que emite quase como um mantra, numa espécie de diálogo entre ela e as abelhas,  com este enunciado extremamente marcante:

“Metade pra você, metade pra mim”

Embora Hatidze não tenha tido a oportunidade de estudar, ela aprendeu os segredos da criação das abelhas, e enquanto pode cuidar solitariamente das suas colmeias, suas interações com a natureza eram harmoniosas e totalmente sustentáveis. Sabia que não podia extrair todo o mel das colmeias porque as abelhas iriam precisar do alimento para se nutrirem em dias difíceis de inverno rigoroso, então dividia igualmente o volume de mel disponível, e assim conseguia manter vivas as colmeias:

“Metade pra você, metade pra mim”

Ao aparecimento de uma família nômade e numerosa neste lugar onde moravam apenas ela e sua mãe,  Hatidze vê-se obrigada a enfrentar inúmeros conflitos com estes vizinhos que focavam na obtenção de um lucro rápido com a extração dos recursos daquela terra. Exploraram de maneira tão desordenada a região, que logo se instalou a desorganização do ecossistema como um todo. O equilíbrio ecológico se rompeu e enquanto os seus vizinhos exploravam os recursos naturais de uma maneira competitiva e desordenada, visando extrair o máximo com o mínimo de tempo, foi desencadeando-se a destruição das colmeias que Hatidze havia conseguido manter por tantos anos como fonte de alimento e sustento.  Frente ao desrespeito às regras fundamentais da natureza, nos deparamos com o impacto da perda dos recursos naturais que mantinham a sobrevivência de todos ali. O filme é tão real, que mais parece uma ficção, e incrivelmente passamos a fazer parte desta história como se ela tivesse sido criada para nos impactar com todo o conteúdo emocional que ela nos mobiliza. Enfim, um documentário de excelência máxima!

Muitas podem ser as associações de idéias, mas vou me permitir relatar no próximo post o quanto também fiquei impactada com o relato dos diretores sobre as dificuldades que eles tiveram durante as filmagens que duraram três anos e somaram 400 horas, o que permitiu com que este documentário registrasse um ciclo completo de vida, ou melhor, vários momentos e ciclos de vida puderam ser observados, analisados e editados para compor a imagem de que é possível recuperar o equilíbrio quando nos colocamos de maneira humilde frente aos limites do que é mais natural.

 

 

Catarina Rabello
Psicóloga  Crp 30103/06
Psicoterapeuta de Casais
Psicanalista membro efetivo do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae

E-mail: contato@psicatarina.com 

Filme “O Carteiro e o Poeta” : Reflexões sobre Psicanálise

Por | Abordagem psicanalítica, Metáforas psicanalíticas, Psicanálise | Nenhum Comentário

O filme “O Carteiro e o Poeta” ( Il Postino, 1994, Italia) foi produzido a partir de uma adaptação do romance do escritor chileno Antonio Skarmeta, “Paciência Ardente” (1985). Dirigido por Michael Redford, o filme recebeu este título só na tradução em português, nos outros idiomas foi traduzido por “O Carteiro”. O co-diretor e personagem principal Massimo Troisi, era portador de uma cardiopatia grave e morreu ao final das filmagens. O Carteiro é um filme lindíssimo, com visual e trilha sonora maravilhosos, consegue transmitir com extrema sensibilidade e beleza a construção de uma relação de amizade entre o carteiro Mario e o poeta chileno Pablo Neruda, relação esta suficientemente forte para produzir uma verdadeira transformação. O filme desenvolve-se em uma pequena ilha italiana na década de 50 onde Pablo Neruda teria ficado exilado e o carteiro Mario, pessoa simples e humilde, ao lhe entregar as cartas, passa a se interessar pela capacidade do poeta em dominar as palavras e em conquistar um novo mundo de idéias e desejos mobilizados por esse contato, que é bem restrito num primeiro momento, mas, que gradativamente vai se transformando em uma relação profunda de amizade mediada pela capacidade de empatia e de sentir cada detalhe, expressar em uma forma poética e conferir valor a tudo o que é vivido pelos sentidos.

O carteiro fica muito interessado em descobrir como Neruda consegue receber tantas cartas de  mulheres apaixonadas… qual seria a sua magia? E inicia-se aí uma linda jornada compartilhada  sobre o que o poeta lhe apresenta a respeito das metáforas. O carteiro lhe pergunta: “O que é metáfora?” O poeta responde: “Metáfora é dizer as coisas de outra maneira”. Então o carteiro diz: “Quer dizer que tudo pode virar uma metáfora?” e o poeta responde: “Sim, tudo pode ser transformado em metáfora”. O carteiro, que era filho de pescador, não gostava de pescar, e ficava enjoado com as ondas do mar, sente-se despertado a se reconectar com a beleza do mar, das ondas, do vento, e, aos poucos passa a ter um novo olhar à natureza que o cerca, conduzido pela capacidade de dar um sentido às sensações, podendo acrescentar uma forma linguística e simbólica às emoções, aos sentimentos, às suas percepções, aprendendo a transformar as palavras em metáforas, passando a acreditar que ele mesmo também poderia transformar-se em um poeta e vir a conquistar  uma mulher. Quando Neruda  questiona Mario por ter utilizado um poema dele para aproximar-se da moça que ele se apaixonara, Mario responde: “A poesia é de quem precisa dela”.

De metáfora em metáfora, poderíamos nós também fazermos este exercício de metaforizar a relação entre o carteiro e o poeta para uma relação entre o analisando e seu analista? Sim, com certeza. A  relação deles não estava isenta de uma ideologia. Neruda, em seu papel político e intelectual compartilhava uma ideologia socialista-comunista, que também despertou no carteiro uma posição crítica sobre as relações abusivas de poder político que permeavam a sociedade daquela pequena ilha onde vivia. Digamos que uma relação terapêutica psicanalítica também não está isenta de uma ideologia, já que a capacidade de falar sobre si mesmo amplia a visão como um todo, e naturalmente favorece uma consciência de si mesmo em relação ao meio, permite ao paciente perceber, ter consciência e situar-se melhor em dinâmicas de relacionamentos difíceis e favorece um olhar crítico em relação à sociedade mais ampla.

A ampliação da capacidade de simbolizar e criar novas interpretações para os afetos, emoções e experiências faz com que a pessoa torne-se um agente cada vez mais ativo de seu próprio destino, sujeito de seu próprio desejo, capaz de sair de uma posição de vítima de um destino pré-determinado para uma posição ativa em direção aos seus ideais, às suas crenças e ao seu desejo. A análise é um processo terapêutico fundamentado também pela capacidade de metaforizar, selecionar, triar o que pode ser extraído das vivências pessoais, o que contribui para a elaboração psíquica e consolidação de uma subjetividade que permite lidar melhor com a própria história, seus traumas e carências. Ao acrescentar novos sentidos ao vivido, modifica-se a cadeia circular de pensamentos e sentimentos. A capacidade de incluir palavras e simbolizar as questões que emanam de uma forma inconsciente à consciência, pode gerar novos circuitos entre as emoções e sentimentos e, desta forma, libertar o ser de uma repetição contínua, queixosa e sem vida, como é comum aos pacientes portadores de sintomas psíquicos, mentais ou psicossomáticos. Libertar-se de padrões doentios e repetitivos de sentimentos, pensamentos e relacionamentos pressupõe um longo trabalho mental, e o analista, assim como o poeta, pode assumir o papel de um fio condutor a uma abertura ao mundo da consciência de si próprio em relação ao outro e ao meio, podendo situar-se melhor nesta zona fronteiriça e de difícil acesso, que se coloca como desafio de equilíbrio e subjetividade, entre o eu e o outro. O trabalho de análise das experiências dolorosas, de traumas e de sintomas mentais é árduo, porém, potencialmente rico da capacidade de ampliação do ser para uma nova possibilidade de posicionamento em relação à própria vida e fonte de transformação real.

 

 

Catarina Rabello
Psicanalista membro efetivo do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae
Crp 30103/06

Contato: (11) 971121432
Consultório: Perdizes: R. Ministro Godoy, 1301
                         Tatuapé: R. Serra de Botucatu, 48

Terapia de Casal, uma colcha de retalhos?

Por | Abordagem psicanalítica, Dinâmicas disfuncionais, Metáforas psicanalíticas, Psicanálise, Simbolização e elaboração psíquica, Terapia de Casal, Trabalho do Sonho | Nenhum Comentário

Se, em um primeiro momento, podemos observar o trabalho finalizado de uma colcha de retalhos como uma produção elaborada de arte que nos transmite uma harmonia e até uma tranquilidade ao olhar, num segundo momento, podemos nos perguntar: qual foi o segredo para chegar a este resultado tão complexo?

Sob diversos pontos de vista podemos estabelecer metáforas entre o processo psicanalítico/psicoterápico e os passos do trabalho artesanal que envolvem o costurar uma colcha de retalhos, lembrando-nos que esta é uma arte antiga passada de geração a geração e que não morre apesar de toda a facilidade que temos em adquirir uma colcha industrializada. A arte manual carrega um valor especial por excelência, pois jamais será possível nem desejável produzir uma outra peça de arte idêntica à original. A integração entre o criador e a sua arte é única,  assim como cada encontro humano jamais poderá ser reproduzido substituindo-se uma pessoa por outra, ou com a mesma pessoa em momentos diferentes de uma mesma história.

Se pudermos seguir todos os passos desta criação artesanal, iniciamos pensando nas etapas que organizam o processo de fabricação até chegarmos ao trabalho final, como a escolha dos tecidos, das formas, das cores, dos tamanhos, da disposição dos retalhos, enfim, pensamos em todos os detalhes técnicos da produção. Se quisermos transformar este momento de produção criativa em um ato terapêutico,  podemos acrescentar uma leitura simbólica deste fazer, e, com toda a possibilidade de integrar sentidos aos pequenos passos deste trabalho, agregamos vida, sentimento, desejo, emoção, força,  potencial, e tudo o que for passível de ser projetado neste rico trabalho artesanal.

A possibilidade de  agregar sentidos a um ato de criação transforma-o por si só em um veículo de elaboração de vivências tanto objetivas quanto subjetivas. Objetivo é o ato de costurar, porém, nada mais subjetivo do que poder costurar as vivências internas, aquelas que especialmente transbordam quaisquer limites se não forem bem organizadas e costuradas pelo psiquismo adulto. O ato da costura é por demais dolorido porque é precedido por inúmeros cortes, e nem sempre é fácil escolher o ângulo e a dimensão do corte… às vezes cortamos demais, às vezes de menos. Fazer parte de um processo terapêutico exige uma crença de que a dupla terapeuta/paciente, analista/analisando, seja mais habilidosa para lidar com os cortes e costuras do que empreender-se neste processo solitariamente. A agulha e a linha são os suportes fundamentais a uma costura bem feita, firme e resistente, porém, não basta o momento do planejamento, da idealização, do desejo de criar algo novo. É fundamental por a mão na massa, começar a recortar os retalhos conforme eles forem aparecendo a cada dia, e fazer algo semelhante ao que a nossa mente realiza nos sonhos noturnos, ela se propõe justamente a dar uma forma e um enredo a tantos traços de percepções irregulares e contraditórias, que não se sabe a princípio qual a origem, qual o tema, muito menos quem é o principal personagem do sonho. Entretanto, em questão de segundos, entre um insight e outro,  toda uma configuração interpretativa de um sonho pode reorganizar o seu enredo. Este é um trabalho altamente complexo de análise, de síntese e de elaboração mental, um verdadeiro trabalho artesanal de ligação ponto a ponto, delicado e único da arte de costurar. Uma analogia a esta reflexão podemos considerar com a temática do filme “Colcha de Retalhos”, no original “How to Make an American Quilt” (1995) em que as histórias de amor se entrelaçam com as variadas possibilidades de reconstrução e ressignificação com resultados inéditos, tudo em um enredo leve e marcado por histórias de encontros e desencontros amorosos, ao longo de uma composição grupal que permite um contorno bem cuidadoso de cada retalho que compõe a representação viva do todo, integrando passado e presente em uma composição ao mesmo tempo estética e simbólica.

 

Trechos do filme “How to Make an American Quilt”:

Como Ana disse,
para fazer uma colcha…
deve escolher os retalhos com cuidado.
Se escolher bem, dará destaque à obra…
se escolher mal, as cores ficam sem vida e tiram a sua beleza.

Não há regras a serem seguidas.
Deve-se seguir o instinto e ser corajosa.

 

Catarina Rabello

Psicóloga e Psicanalista membro efetivo do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae
E-mail: contato@psicatarina.com

 

Fotografia: José Murilo – Colcha de Retalhos de Tecido (Paraty – RJ)

 

 

Filme “A Fortunate Man”

Por | Dinâmicas disfuncionais, Psicanalise, Psicanálise e cultura | Nenhum Comentário

“A Fortunate Man” é um drama dinamarquês dirigido por Bille August em 2018. O filme foi baseado no romance de oito volumes traduzido para o inglês “Lucky Per”. O autor do romance, Henrik Pontoppidan, escreveu a obra entre 1898 e 1904, o que lhe rendeu o Prêmio Nobel de Literatura em 1917.

O drama desenvolve-se sobre o tema “ser afortunado”, “ter sorte” x “ser feliz”. Aliás, em dinamarquês, a mesma palavra “Lykke”, refere-se tanto à sorte como à felicidade. O filme nos remete também ao termo sorte como destino, transportando-nos às raízes da infância como determinantes de um destino de infortúnios pessoais, marcadas no inconsciente como lembranças encobridoras e segredos familiares, que permeiam as percepções, memórias e fantasias infantis. Em “Romances familiares” e “Lembranças encobridoras”, como entre outros textos, Freud nos apresenta sobre a importância dos primeiros anos de vida na estruturação do psiquismo e sobre as determinações inconscientes, desejo e memórias reprimidas que interagem no funcionamento mental. Numa sociedade aristocrática dinamarquesa do início do século XX, marcada por fortes tendências religiosas e político-filosóficas, o personagem principal,  Peter Sidenius, tenta desesperadamente encontrar-se com a sua sorte, seu destino,  sua subjetividade. Entre os inúmeros conflitos com a família, tenta desligar-se de suas raízes de origem cristã, mas sofre com os efeitos psíquicos que este rompimento lhe causa. Tenta quase como um mecanismo de compensação, realizar um projeto de engenharia de grande porte que iria valorizar a sua cidade natal tentando estabelecer uma enorme ligação através de canais, barragens e estações entre as regiões mais pobres e as regiões mais ricas da Dinamarca, utilizando-se do aproveitamento e transformação das energias das marés e eólica em energia elétrica. Entretanto, este projeto torna-se inviável quando se vê obrigado a submeter-se aos valores e ao poder financeiro da alta burguesia dinamarquesa. Encontra-se na fase adulta e próximo à meia idade ainda tendo que lidar com os mesmos conflitos que trazia da infância, e não dispondo de recursos psíquicos para elaborá-los, recolhe-se em uma vida solitária, circulando ao longo da vida entre o sucesso, o narcisismo e a catástrofe. Um filme lindíssimo, que nos remete a inúmeras reflexões e problematizações que permeiam as idéias dos pensadores do início do século XX. O filme nos aproxima dos traços culturais e sociais da sociedade europeia do início do século XX e às questões subjetivas que se delineiam em forma de profundos dramas associados aos conflitos familiares que são marcados pela infância. Estes que independem de uma época, mas se reatualizam nas dinâmicas intergeracionais familiares, como nos coloca a metáfora do relógio, um dos símbolos fundamentais do filme remetendo-nos à atemporalidade do inconsciente.

Inconsciente, um lugar secreto

Por | Abordagem psicanalítica, Inconsciente, Psicanálise | Nenhum Comentário

 

No filme “Jardim Secreto” (1993), direção de Agnieszka Holland, clássico do cinema adaptado do conto infanto-juvenil escrito por Francis Burnett em 1911, uma frase se destaca entre todas as representações e se impõe como um mote: “Se você olhar bem, verá que todo mundo é um jardim”. Toda a nossa vida é um jardim potencialmente apto a germinar e crescer, desde que lhe sejam oferecidos os cuidados e requisitos essenciais, assim como um bebê em sua condição de dependência absoluta não sobreviveria em meio a um desamparo na sua radicalidade mais concreta. No filme as imagens arquivadas do jardim secreto trazem as lembranças da balança que causou a queda e por consequência o óbito da mãe ainda grávida. Esta cena congelada transformou o jardim em um lugar inacessível, proibido e duramente abandonado. No momento em que ocorre o nascimento do filho e este coincide com a morte materna, desencadeia-se uma sequência de situações que marcam uma interrupção à vida de relações, e a criança fica à mercê do isolamento e das fantasias paternas de ameaça de morte. O menino passa então a ser “protegido” e fica resguardado em seu próprio quarto como se estivesse em uma prisão ou em uma bolha, onde até mesmo a luz do sol passa a ser interpretada como uma séria ameaça à sua saúde e à sua vida.

O abandono neste filme é retratado como uma experiência comum a vários personagens, tanto crianças como adultos, mas em especial, às crianças, que vão descobrindo pouco a pouco, formas de sobreviverem ao desamparo. Cada um deles se organiza de maneira particular, e em meio a tanta aridez afetiva, surgem quase como que em um passe de mágica, soluções ora sintomáticas, ora criativas para superar a dor do abandono, do desamparo e da solidão. A aridez afetiva na infância pode desencadear poderosas e rígidas couraças que passam a se transformar em verdadeiras estruturas defensivas para pensar e interpretar o real. Felizmente em “Jardim Secreto” também escondem-se novas possibilidades e o jardim não sucumbe apenas porque o jardineiro da família, mesmo sem autorização, continua cuidando do jardim fechado e trancado, de forma secreta. Ainda restava muita vida naquele jardim aparentemente morto, e o jardineiro sabia que deveria ser discreto para não ser visto apenas como um funcionário desobediente às ordens de seu patrão e correr o risco ser afastado de sua função, já que sabia da importância da sua atuação e vivia intensamente o seu trabalho como uma verdadeira missão.

Todos somos vítimas de experiências traumáticas em momentos precoces da vida em maior ou menor grau e, de uma forma ou outra, em torno delas criamos armaduras de proteção, ora suficientes, ora exageradas, ora congruentes, ora desajustadas. Estas soluções encontramos através de equações simbólicas inconscientes, e assim criamos  mecanismos que nos permitem viver em estado de alerta permanente. O psicanalista argentino Luis Chiozza define três níveis da vida de relação; a vida pública, a vida íntima e a vida secreta. Circulamos continuamente por estes três níveis de relação, sendo a vida pública aquela que nos retrata e nos identifica de maneira seletiva para o outro em geral. A vida íntima é aquela que nos permite sermos conhecidos mais profundamente somente por poucas pessoas com as quais temos um relacionamento íntimo, e a vida secreta envolve todo um universo de experiências, sensações e pensamentos que faz parte de um mundo secreto subjetivo, em parte consciente e em grande parte inconsciente, que não é compartilhado com ninguém.

O inconsciente habita o nosso mundo secreto com suas leis gerais da lógica do inconsciente produzindo inúmeras teorias que são comprovadas a partir de cálculos e experimentações que misturam o presente e o passado, com seus traços de memória e suas representações psíquicas, o que resulta em uma lógica com características diversas da lógica da razão. São tão complexos estes cálculos, que uma vez estabelecidos, cristalizam-se como verdades absolutas regendo linhas de pensamento e de conduta reativa a tudo o que afeta o ser, de maneira muito particular. Em nosso mundo secreto só temos acesso a uma pequena parte desses cálculos, e o que nos apresenta para nós mesmos são resultantes de tentativas de busca de um apaziguamento entre estas tantas linhas teóricas de pensamento que a mente é capaz de produzir. Habita este mundo secreto também a vida das emoções, percepções, devaneios e fantasias, um misto de imaginário e realidade, um universo onírico que, de forma semelhante ao jardineiro do “Jardim Secreto”, não aceita nem ordens nem proibições, mas se mantém alimentando e cuidando do jardim à sua maneira. A vida mental secreta desenvolve-se às vezes sem limites e por este motivo corre o risco de interferir no crescimento saudável do ser e na harmonia entre os três níveis de relações, podendo manter os incontáveis conflitos intrapsíquicos em um nível tão elevado que são capazes de produzir efeitos psicopatológicos graves, severo desgaste do equilíbrio mente/corpo e supressão da energia vital.

 

 

Catarina Rabello
Psicóloga Crp 30103/06
Psicanalista membro efetivo do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae

Desafios da Empresa Familiar Psicóloga Tatuapé/Perdizes

Por | Abordagem psicanalítica, Dinâmicas disfuncionais, Empresas familiares e coaching, Empresas familiares e psicoterapia, Subjetividade e relações de trabalho, Terapia familiar | Nenhum Comentário

 

O primeiro desafio a ser enfrentado pelas empresas familiares está intimamente associado aos problemas de comunicação e definição clara de papéis e funções. Os conflitos ocasionados pelas falhas de comunicação e indefinição de papéis podem perdurar ao longo do tempo e podem  desencadear interferências em todas as etapas do processo de trabalho, gerando o efeito cascata e comprometendo profundamente os resultados de todo o empreendimento.

Os problemas de comunicação da empresa familiar envolvem desde as demandas atuais até uma visão da historicidade da empresa com todos os seus vieses que permeiam o enorme volume de mensagens que passam não apenas pelo processo transmissor/receptor, mas que envolvem os perfis de relacionamento e subjetividade dos seus integrantes, as histórias de compartilhamento maior ou menor de idéias, propostas, formas de gerenciamento, conflitos de propósitos, metas, ideais engajamento individual e participação com definição de papéis nas diversas esferas do sistema de trabalho. A empresa familiar tende a reproduzir os padrões de convivência e comunicação familiar nas relações de trabalho, mas seus integrantes não se questionam sobre estes padrões de interação por serem internalizados e automatizados por longa data.

Por menor que seja a empresa familiar, os problemas de comunicação entre seus líderes representam um grande fator de risco à sua manutenção e crescimento. Se a empresa familiar se compõe de integrantes de duas gerações como pais e filhos, pode haver uma dificuldade de reconhecimento de valores de ambos os lados: Os pais não aceitando as inovações propostas pelos filhos e estes não reconhecendo o valor da experiência acumulada dos pais. Muitas vezes o realinhamento dos processos de comunicação na empresa implica uma reorganização das dinâmicas de relacionamento familiar que se cristalizaram e se reatualizam em conflitos contínuos e repetitivos entre os seus membros. Isto exige dos seus integrantes um nível de autoconhecimento que pode ser alcançado em um processo terapêutico, já que envolve emoções, memórias e sentimentos que podem ser difíceis de elaborar.

Frente às dificuldades de diálogo e diferentes níveis de divergências que podem ter suas raízes naturais provenientes das dinâmicas familiares disfuncionais e das estruturas individuais de personalidade, as interpretações das mensagens podem ser truncadas. Algumas mensagens podem ficar simplesmente deixadas de lado e não serem suficientemente valorizadas, ou, pelo contrário, serem interpretadas com distorções repetindo-se os mesmos padrões cristalizados da comunicação familiar, gerando reações ora impulsivas e agressivas, ora de rejeição ou de falta de interesse a uma escuta verdadeira e mais profunda. Todas as distorções das mensagens são possíveis no processo de comunicação, já que tanto no processo de transmissão de idéias como na sua escuta participam profundos mecanismos psíquicos inconscientes que determinam a forma como cada indivíduo processa uma informação, em especial no contexto de relações que envolvem afetividade e histórico de convivência familiar. Embora façamos parte de uma mesma comunidade linguística, inúmeros são os abismos com os quais temos que nos deparar frente às comunicações diárias no ambiente de trabalho, pois as mensagens que incidem sobre a autoestima, como por exemplo, ordens, críticas e correções, podem despertar reações que se originam em mecanismos de defesa que independem das situações profissionais.

Saber analisar e lidar de forma eficiente com os processos de comunicação, sem dúvida, torna-se um pré-requisito importante e essencial ao sucesso da empresa familiar, exige um investimento nas questões do relacionamento familiar, demanda um olhar para aquilo que não é possível enxergar com objetividade, mas com o olhar de quem pode ultrapassar o limite dos conflitos e das ressonâncias dos mal-entendidos acumulados ao longo de toda uma história com seus avanços e retrocessos.  Na maioria das vezes os entraves psíquicos do relacionamento não são percebidos, muito menos decodificados, o que leva a processos de  repetição e frustração contínua no processo de trabalho. Não podemos minimizar os efeitos da história familiar nas dinâmicas de trabalho das empresas familiares.  Neste caso um profissional especializado na área de saúde mental psicólogo ou psicanalista com experiência em terapia familiar pode ajudar no processamento das questões psíquicas dos integrantes, colaborando para que o autoconhecimento seja uma ferramenta indispensável na solução de conflitos que se interpõem e interagem no contexto profissional das relações da empresa familiar.

 

 

Catarina Rabello
Crp: 30103/06
Psicanalista Instituto Sedes Sapientiae

Psicoterapia Familiar e Individual
Psicanálise

Psicanálise dos conflitos da Empresa Familiar
Coaching para Empresas Familiares

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O envelhecer

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Desde que nascemos estamos envelhecendo, porém, esta consciência torna-se mais reforçada a partir de algumas décadas de vida, quando percebemos mudanças físicas indesejáveis na pele, no cabelo, nas formas corporais, e quando observamos uma redução da funcionalidade do organismo para lidar com os excessos de toda ordem, aqueles que antes eram tranquilamente suportáveis, e a partir de uma certa idade, o organismo começa a sinalizar com seus limites e impedimentos.

Temos no dia de hoje, 20 de março, marcado em nosso calendário o início de uma nova estação. O outono caracteriza muito bem a simbologia do envelhecimento, com uma roupagem nova, um novo colorido permeado pela troca sutil e gradativa das folhas das árvores sazonais. Cada uma das estações tem a sua beleza característica, e, ao se dar conta que foi vivido um longo percurso, uma pessoa tem o direito de elaborar os inúmeros sentidos para tudo aquilo que já viveu e então reorganizar os focos que evidenciam as suas experiências futuras.  Estamos diante de plena transformação e costumamos dar mais valor à saúde quando envelhecemos do que quando a temos em abundância nas fases anteriores da vida. Tudo se modifica, algumas funções são perdidas, algumas ilusões são dissolvidas, mas a natureza é sábia, e nos oferta um tempo razoavelmente longo para nos prepararmos para o outono da vida.

Se o outono implica uma mudança de cores na natureza, o envelhecimento pode abrir espaço para um novo olhar ao que passou, ao que deixou de ser importante, e pode dirigir-se agora àquilo que assume um novo valor. Cada pessoa que pode caminhar no seu processo de subjetivação tem o direito de restaurar a sua vida emocional, reordenar as grades das suas prioridades, reencontrar-se consigo mesma e com seus pares, reconfigurar exigências e desejos e compartilhar dos efeitos da empatia com quem partilha semelhantes vivências. Tudo se transforma na natureza, entretanto, ainda sofremos com os impactos sociais frente ao envelhecimento e temos ainda muito a aprender com as outras culturas mais antigas que a nossa, a conviver melhor com aqueles que conseguiram enfrentar um maior número de desafios. Nunca é tarde demais para realizar um sonho, nunca é cedo demais para mudar um hábito, nunca é impossível aprender mais alguma coisa. Nunca é tarde demais para reconsiderar e reavaliar. Nunca é tarde para repensar e reanalisar. O tempo pode ser o nosso melhor amigo se soubermos dar valor a ele. Ao olharmos o tempo com os olhos de um pesquisador químico, encontraremos nas transformações que se sucedem a lógica de suas equações, a composição de seus elementos e as dosagens específicas que nos fizeram ser como somos, seres plenos de significação.

 

 

Catarina Rabello
Psicanalista membro efetivo do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae
Psicanálise e Psicoterapia

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Psicoterapia, resiliência e saúde mental

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Assim como o girassol busca pela iluminação do sol para crescer e florescer, a busca pela saúde encontra-se intrínseca ao ser humano. Desde que nenhuma condição atmosférica, do solo ou da própria planta prejudique o seu desenvolvimento, o girassol mantém o seu potencial criativo e estético pelas suas cores vibrantes e seu porte radiante. Acontece que algumas situações específicas e danosas podem  gerar retração, pontos de fixação e até mesmo bloqueio do desenvolvimento que, a princípio, deveria ser saudável.

O mesmo podemos observar ao longo  do desenvolvimento psíquico. Algo vivido da ordem traumática como experiências e vivências infantis que podem causar danos ao psiquismo, podem transformar-se em um obstáculo radical ao pleno desenvolvimento do indivíduo, à paralisação de sua potencialidade criativa, ao não florescimento de sua capacidade de resiliência, e cristalizar-se como um impedimento ao processo natural de busca do bem-estar consigo mesmo e com o ambiente.

Muitas vezes um broto de um girassol não consegue se desenvolver pela falta de algumas condições ambientais adequadas, porém, quem se interessa pela produção do girassol, naturalmente estuda detalhadamente todos os aspectos que possam interferir no seu processo de cultivo e crescimento.

Quando pensamos no processo de aprendizagem infantil, costumamos lembrar com maior foco das questões da aprendizagem escolar e esquecemos, não raras vezes, que a criança está passando por um processo de aprendizagem global, inclusive das habilidades necessárias à socialização, da capacidade de resiliência para a superação de conflitos e frustrações. Todo este desenvolvimento exige dos educadores um conhecimento profundo do que representa o psiquismo infantil, suas nuances psico-afetivas, sua possibilidade de gerenciar emoções, seu potencial de percepção, processamento e absorção do mundo adulto, com todas as suas razões e incoerências. Entretanto, quando os educadores se vêem obrigados a olhar as dificuldades que uma criança vem enfrentando no seu dia-a-dia, passam a dar mais valor a esta etapa do desenvolvimento e precisam mudar seus hábitos e condutas educativas, sentem-se impotentes para reverter situações familiares que já mostram sinais de adoecimento. A falta de conhecimento sobre a psicologia infantil pode levar a erros grosseiros dos educadores que podem prejudicar a construção da autoestima e autoimagem infantil, podem levar ao cultivo de medos e terrores, à inibição da criatividade, e até à impossibilidade de auto-aceitação, se não souberem lidar com equilíbrio com as falhas infantis.

Pais e educadores que repetem os modelos educativos nos quais moldaram suas personalidades resistem a questionamentos de suas incoerências, e, ao não conseguirem estabelecer um equilíbrio entre as demandas pessoais e as demandas geradas pelas dinâmicas familiares, sentem-se perdidos e atuam como se estivessem em um laboratório, onde o ensaio-e-erro é permitido. Dinâmicas familiares em que se perdem os referenciais de equilíbrio emocional podem prejudicar o desenvolvimento da capacidade infantil e futuramente do adulto, de resiliência. Entretanto, as questões que permeiam uma convivência familiar estão impregnadas de vivências e experiências mal resolvidas que marcaram as histórias dos pais e/ou educadores e mantêm-se arquivadas em redutos da memória inconsciente. Os conflitos transgeracionais tendem a se repetir até que algum evento muito impactante na história familiar possa reorganizar os elos desta cadeia de repetições incorrigíveis e inconscientes, aos quais os pais também foram expostos de maneira imperativa e indefesa.

Sem dúvida, hoje a psicanálise e as neurociências detêm muita informação para colaborar para um conhecimento mais aprofundado dos requisitos essenciais para o desenvolvimento psíquico infantil com saúde, qualidade e construção de valores e ferramentas necessárias à condução de um adulto saudável, resiliente e capaz de alcançar o bem-estar. A psicoterapia familiar e a psicoterapia de casais também podem representar possibilidades valiosas que contribuem para a reordenação das dinâmicas familiares, tanto no âmbito de tratamento como de prevenção. Casais e famílias que encontram um espaço terapêutico para elaborarem suas percepções, dúvidas e questionamentos, podem construir ambientes  emocionais mais favoráveis ao desenvolvimento familiar e individual de seus integrantes com mais equilíbrio e fluidez nas relações de afeto.

 

 

Catarina Rabello
Psicóloga Psicanalista Crp 30103/06

Psicanálise e Psicoterapia
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